A carne sustentável é um conceito cada vez mais relevante na indústria de alimentos. Ela se refere à produção de carne que leva em consideração não apenas a eficiência e qualidade, mas também a sustentabilidade, o bem-estar animal e a responsabilidade social.
Essa abordagem busca minimizar os danos ao meio ambiente, promover práticas agrícolas justas e garantir que os animais sejam criados em condições dignas. Mas, além das questões ambientais, a carne sustentável se conecta com a saúde dos consumidores e a demanda crescente por transparência nas cadeias produtivas.
Consumidores e empresas estão cada vez mais atentos à origem dos alimentos e ao impacto que eles têm em suas vidas e no planeta. Logo, essa é uma maneira de alinhar o consumo com valores éticos e de contribuir para um futuro mais equilibrado.
Continue a leitura para entender mais a fundo o que caracteriza a carne sustentável, os desafios enfrentados pela indústria para adotá-la e as oportunidades que essa prática oferece.
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O que é carne sustentável?
A carne sustentável recebe essa denominação porque ela se adequou às 144 normas que precisam ser seguidas à risca para que o produtor consiga receber a certificação criada pela ONG americana Rainforest Alliance.
Amália Sechis Farina, diretora comercial da marca brasileira de carne sustentável Beef Passion explica que essas normas exercem influência em toda a cadeia produtiva, garantindo bem-estar aos animais do nascimento ao abate.
Assim, segundo Amália, a criação sustentável resultará em uma carne produzida dentro de variados requisitos, tais como:
- Ausência de desmatamento ou destruição de ecossistemas;
- Diminuição e o uso seguro de agrotóxicos;
- Coleta e destino adequado de resíduos;
- Bem-estar associado a rastreabilidade animal, que ocorrerá do nascimento ao abate;
- Contratação e segurança de todos os trabalhadores, além do não trabalho infantil;
- Recuperação de florestas, preservação das matas ciliares e nascentes, e manutenção da qualidade da água.
Além disso, a diretora comercial da Beef Passion explica que a produção de uma carne sustentável visa também diminuir a emissão de gases de efeito estufa.
“Por meio da integração lavoura-pecuária-floresta e da nutrição adequada, conseguimos diminuir expressivamente a emissão de gases de efeito estufa, como metano e compostos de carbono, indicando um ganho ambiental expressivo”.
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Selos e certificações para carnes sustentáveis
Os selos para carnes sustentáveis ajudam na identificação e garantia de que os produtos seguem padrões rigorosos de sustentabilidade. Eles servem como uma referência confiável para consumidores e empresas que desejam optar por alimentos que respeitam o meio ambiente, os animais e as pessoas envolvidas na produção.
Essas certificações geralmente são emitidas por organizações independentes que auditam e monitoram as práticas das fazendas e empresas produtoras. Eles podem abranger diferentes aspectos da produção, como práticas agrícolas sustentáveis, redução de impactos ambientais, bem-estar animal e justiça social.
A partir disso, um selo confiável assegura que a carne foi produzida de acordo com critérios específicos que promovem a sustentabilidade. Isso proporciona confiança ao consumidor de que está fazendo uma escolha consciente e responsável.
Além de garantir a sustentabilidade, os selos também ajudam a diferenciar os produtos no mercado, permitindo que as empresas que adotam práticas sustentáveis se destaquem da concorrência.
Essa diferenciação pode levar a um maior reconhecimento da marca e, potencialmente, a um aumento nas vendas, à medida que mais consumidores buscam produtos que reflitam seus valores pessoais.
Selo Rainforest Alliance
O selo Rainforest Alliance é um dos mais reconhecidos globalmente quando se trata de práticas sustentáveis na produção de alimentos, incluindo a carne. Ele é concedido a produtos que cumprem com rigorosos critérios ambientais, sociais e econômicos, promovendo um equilíbrio entre as necessidades humanas e a conservação da natureza.
A ONG trabalha com foco em proteger florestas, melhorar os meios de subsistência das comunidades locais e promover o uso sustentável da terra. Para que um produto de carne receba o selo, os produtores devem seguir práticas que protejam a biodiversidade, preservem os recursos naturais e promovam o bem-estar animal.
Isso inclui garantir que os animais sejam criados em condições que permitam comportamentos naturais e em ambientes que minimizem o estresse e o sofrimento. Além disso, a certificação incentiva práticas agrícolas que ajudem a mitigar as mudanças climáticas, como a redução de emissões de carbono e a conservação de áreas florestais.
O selo Rainforest Alliance também tem um forte enfoque social, assegurando que os trabalhadores envolvidos na produção de carne sejam tratados de maneira justa, com condições de trabalho seguras e salários dignos.
Ao escolher produtos com este selo, os consumidores consequentemente apoiam práticas que promovem um mundo mais sustentável e justo, ao mesmo tempo em que ajudam a proteger algumas das regiões mais biodiversas do planeta.
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Como obter o selo de carne sustentável?
A carne, quando recebe a denominação de sustentável, recebe um selo conhecido como Rainforest Alliance Certified (RAS). Segundo Amália Farina, “este é um selo de certificação verde que valida produções agrícolas, florestais ou turísticas que atendem os padrões de excelência em sustentabilidade ambiental, social e econômica”.
Mas, no caso específico da pecuária, como é possível obter o selo de carne sustentável?
A diretora comercial da Beef Passion explica que, na prática, para obter o selo é preciso respeitar os 4 princípios presentes na norma:
1º princípio – Sistema eficaz de planejamento e gestão
Segundo Amália, este princípio inclui uma seção de requisitos específicos e visa promover a área de impacto “Produtividade e rentabilidade da fazenda”.
Além disso, esse princípio dá apoio a outras áreas de impacto dentro da pecuária. “As áreas de conservação da biodiversidade, conservação dos recursos naturais e melhoramento dos meios de vida e bem-estar humano são melhor geridos neste princípio”, diz.
2º princípio – Conservação da biodiversidade
“Através da implementação dos critérios deste princípio, as fazendas protegem os ecossistemas naturais dentro de sua propriedade, ou seja, não contribuem para o desmatamento”, explica Amália.
3º princípio – Conservação dos recursos naturais
Amália explica que a cuidadosa conservação dos recursos naturais é a base fundamental para a agropecuária sustentável. “Precisamos minimizar a poluição ambiental, pois isso beneficia pessoas, polinizadores, animais e muito mais”, acredita Amália.
Além do mais, este princípio visa garantir a saúde do solo e da água, assim como reduzir o uso de agroquímicos e combustíveis fósseis no processo de produção.
4º princípio – Oferta de melhores meios de vida e bem-estar humano
“Todos os seres humanos têm igual valor e, por isso, devem ser tratados de forma igualitária”, acredita Amália.
Por fim, para obter o selo de carne sustentável é preciso pleitear o certificado por meio de processo de auditoria realizado por uma Certificadora treinada e credenciada pela Rainforest Alliance no Brasil.
Programa Selo Verde Brasil
O Programa Selo Verde Brasil é uma certificação voltada para a produção sustentável de carne. Diferentemente de selos internacionais, como o Rainforest Alliance, que tem um foco global, ele valoriza práticas adaptadas às realidades e desafios ambientais do nosso país.
Esse selo garante que a carne seja produzida de forma que respeite o meio ambiente, promova o bem-estar animal e assegure condições justas de trabalho, alinhadas às particularidades brasileiras.
Além disso, o Selo Verde Brasil destaca a importância de proteger os biomas nacionais, como a Amazônia e o Cerrado, e promover o uso responsável dos recursos naturais.
Ele também assegura que as práticas de produção contribuam para a conservação da biodiversidade e a mitigação de impactos ambientais, elementos cruciais para uma carne verdadeiramente sustentável.
Como obter o Selo Verde Brasil?
Para obter o Selo Verde Brasil, produtores de carne devem adotar práticas que atendam aos critérios rigorosos do programa, focados nas especificidades ambientais e sociais do Brasil.
O processo começa com uma avaliação das práticas atuais e a identificação de áreas que precisam de melhorias.
Após a implementação dessas práticas, uma auditoria independente é realizada para verificar se todos os critérios foram cumpridos. Se aprovados, os produtores recebem o Selo Verde Brasil, que pode ser utilizado em seus produtos.
A certificação exige um compromisso contínuo com a sustentabilidade, com auditorias regulares para garantir a manutenção dos padrões estabelecidos.
O selo não é apenas um reconhecimento, mas um incentivo para a melhoria contínua na produção de carne sustentável no país.
Carne sustentável está alinhada às demandas do consumidor
Nos últimos anos, a busca por alternativas mais sustentáveis no consumo de carne tem crescido significativamente entre os brasileiros. Diversos fatores, como a preocupação com o meio ambiente, o bem-estar animal e a saúde, têm impulsionado essa tendência, refletindo uma mudança importante nos hábitos alimentares da população.
Em 2021, uma pesquisa realizada pela ONG Mercy For Animals no Brasil (MFA), encomendada pelo programa EscolhaVeg, por exemplo, revelou que 81% dos brasileiros já experimentaram alimentos à base de plantas, e que 97% indicam que a saúde foi um dos principais motivos para o consumo.
Essa mudança de comportamento é confirmada por estudos que mostram uma redução no consumo de carne no Brasil. De acordo com uma pesquisa conduzida pela Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) em parceria com o IPEC (2021), 46% dos brasileiros declararam ter deixado de comer carne pelo menos uma vez por semana por vontade própria.
Para se adaptar à nova demanda, mais de 3,2 mil estabelecimentos oferecem opções veganas em seus cardápios. Segundo o estudo da SVB, 32% dos consumidores concordam que preferem a opção vegana quando essa informação é destacada pelo restaurante.
Essa crescente demanda por sustentabilidade está desafiando a indústria a adotar práticas mais responsáveis e a oferecer produtos que atendam a essas expectativas. Nesse sentido, a carne sustentável representa uma oportunidade significativa para o mercado que busca se alinhar com os valores emergentes da sociedade.
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Novidades e tendências em carne sustentável
O mercado de carne sustentável tem evoluído rapidamente, trazendo inovações e novas tendências que estão transformando a maneira como consumimos os alimentos.
Entre as principais novidades estão a carne carbono neutro e as opções plant-based.
Carne carbono neutro
A carne carbono neutro, como o próprio nome já entrega, é produzida de forma a compensar totalmente as emissões de carbono geradas ao longo de sua cadeia produtiva.
Isso é feito por meio de práticas como a recuperação de áreas degradadas, o plantio de árvores e o uso de técnicas agrícolas que capturam carbono do ambiente, como a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
No Brasil, a certificação “Carne Carbono Neutro” foi lançada pela Embrapa, que tem liderado iniciativas para tornar a produção de carne mais sustentável. Essa certificação garante que toda a emissão de gases de efeito estufa associada à produção da carne foi neutralizada, tornando-a uma opção mais responsável para o consumidor preocupado com o impacto ambiental.
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Carne plant-based
Já a carne plant-based, ou carne à base de proteína vegetal, é outra grande tendência no mercado de alimentos sustentáveis. Esses produtos são feitos a partir de ingredientes vegetais, como soja, ervilha, grão-de-bico e outros, que são processados para imitar o sabor, a textura e a aparência da carne tradicional.
No Brasil, o mercado de carne plant-based tem crescido rapidamente, impulsionado pela crescente conscientização sobre os benefícios de uma dieta baseada em plantas, tanto para a saúde quanto para o meio ambiente.
Grandes marcas e startups têm investido pesado no desenvolvimento de produtos cada vez mais saborosos e acessíveis, ampliando o alcance dessa alternativa entre os consumidores.
Além de serem mais sustentáveis, as carnes plant-based atendem a um público diverso, incluindo vegetarianos, veganos e flexitarianos, que buscam reduzir o consumo de carne animal sem eliminá-lo completamente.
Carne cultivada
A carne cultivada é mais uma tendência na indústria de proteína animal.
Esse tipo de carne é produzido a partir de células animais em ambientes controlados, sem a necessidade de criar, alimentar ou abater animais.
O processo envolve a coleta de células-tronco, cultivadas em biorreatores. Dentro dessas máquinas, elas crescem e se multiplicam, formando tecidos musculares similares aos encontrados na carne convencional.
Apesar de ainda não estar no mercado brasileiro, essa opção é considerada promissora à produção, pois auxilia a redução do impacto ambiental (já que usa menos água, terra e recursos naturais) e o bem-estar animal.
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Futuro da carne sustentável no Brasil
O futuro da carne sustentável é promissor, com diversas inovações e iniciativas já em andamento. A demanda por produtos mais éticos e ambientalmente responsáveis está crescendo, e a indústria de carne brasileira, uma das maiores do mundo, está se adaptando para atender a essas expectativas.
Programas de certificação, como o Selo Verde Brasil e a Carne Carbono Neutro, são exemplos de como a produção de carne está se tornando mais alinhada aos princípios de sustentabilidade.
Nos próximos anos, espera-se que a carne sustentável continue a ganhar espaço no mercado, com mais produtores adotando práticas que minimizem o impacto ambiental e promovam o bem-estar animal.
A tecnologia também terá um papel importante, com o avanço das alternativas plant-based e a possível chegada ao mercado de carnes cultivadas em laboratório, que prometem reduzir ainda mais a pegada ecológica da produção de carne.
Ao adotar essas novas tendências, a indústria de carne no Brasil pode não apenas atender à crescente demanda interna, mas também se destacar no mercado internacional como um modelo de produção sustentável.