Produtores e consumidores estão em jornadas que podem parecer paralelas, mas não são. Os primeiros querem reduzir custos e aumentar a produtividade, enquanto os segundos procuram por carne com boa qualidade sensorial. Mas os dois objetivos estão ligados e podem ser atingidos com estratégias para reduzir patógenos e deteriorantes na carne bovina in natura.

Esse é o tema da palestra que o Professor Substituto de Tecnologia de Produtos de Origem Animal da DEST/FCA/UNESP (Departamento de Economia, Sociologia e Tecnologia/ Faculdade de Ciências Agronômicas/Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”), Guilherme Sicca Lopes Sampaio, apresenta em 8 de agosto, primeiro dia da TecnoCarne. Confira a entrevista:

Como de fato reduzir patógenos e deteriorantes na carne bovina in natura?

Existe um consenso técnico-científico de que uma abordagem multi-obstáculos, também conhecida como “teoria das barreiras”, composta por estratégias adotadas desde a propriedade rural até o consumidor final, constitui-se na melhor forma de reduzir patógenos e deteriorantes na carne bovina in natura.

Qualquer negligência ao longo da cadeia produtiva, inclusive pelo consumidor, pode resultar na perda da condição higiênico-sanitária estabelecida e mantida pelos demais elos envolvidos.

Quais os benefícios dessa redução para os produtores?

Com relação aos pecuaristas, algumas destas estratégias também reduzem custos de produção e melhoram rendimentos produtivos. Além disso, outras podem repercutir em bonificações por também promoverem a qualidade sensorial da carne. Entretanto, essas estratégias geralmente representam custos adicionais para os pecuaristas. Portanto, se não houver alguma forma de incentivo, as mesmas não serão implementadas ou mantidas pelos produtores rurais.

E para os produtos?

O maior benefício para os produtos está relacionado à inocuidade, mas também maior validade comercial, o que representa expressiva redução de custos para a cadeia produtiva. Isto também pode representar menor impacto sobre o SUS (Sistema Único de Saúde) devido a menor ocorrência de enfermidades veiculadas por alimentos. Entretanto, estas são pouco diagnosticadas e subnotificadas no Brasil, o que dificulta determinar o impacto dessas estratégias sobre o SUS, além também de não permitir o estabelecimento de políticas públicas adequadas.

E aos consumidores?

A garantia de estar consumindo um alimento seguro (inócuo).

Quais os desafios para realizar essa redução?

Esse tipo de avanço geralmente ocorre por meio de reivindicações do mercado consumidor, porém, fomentar a qualidade gera custos e os consumidores precisam estar dispostos a pagar a diferença. Temos a ilusão de que a carne bovina é um insumo de baixo custo, mas na verdade, somente carne de baixa qualidade é barata.

São os paradigmas da carne bovina brasileira. De um lado temos o mercado interno, que absorve 80% da produção nacional, em que, o preço em vez da qualidade, constitui-se no principal critério de compra da carne bovina, o que também está relacionado a alta taxa de abates clandestinos. Por outro lado, o Brasil, na esfera federal, tem um sistema de defesa sanitária animal e de fiscalização dos produtos de origem animal equivalente aos dos países mais exigentes e rigorosos do mundo, os quais exigem produtos com alta qualidade, principalmente com relação a inocuidade. Este contrassenso, esta divergência em qualidade, não mudará enquanto não resolvermos as questões educacionais e socioeconômicas da população brasileira. Portanto, acreditamos que a educação é o caminho para resolvermos todas as deficiências da nossa sociedade.