Costumo me perguntar: por que algumas pessoas insistem em fazer algo que sabem que está errado? Essa reflexão sempre surge quando vejo situações no ambiente corporativo que poderiam ser evitadas com um pouco mais de atenção e integridade. Já testemunhei casos onde erros aparentemente pequenos geraram grandes impactos, seja na qualidade de um produto, na segurança de um processo ou na conformidade com as normas.
Ao longo da minha trajetória, ficou claro que essa questão não está ligada apenas à capacidade técnica ou ao conhecimento das pessoas. Ela está profundamente enraizada em fatores como cultura organizacional, pressões do dia a dia e, muitas vezes, na ausência de processos bem definidos e controles efetivos.
A partir dessa percepção, decidi explorar o tema em três contextos principais: qualidade e produtividade, segurança e compliance, incluindo a ética como um fator fundamental na forma como as pessoas tomam decisões, mesmo sabendo que o que estão fazendo não é o correto.
Quando atalhos comprometem o resultado
No dia a dia das empresas, a pressão por resultados rápidos e eficientes é uma constante. E é exatamente nesse contexto que surge o risco de as pessoas tomarem atalhos, mesmo sabendo que podem comprometer a qualidade. Em muitas ocasiões, isso ocorre porque os processos não são bem documentados ou claros o suficiente.
Por exemplo, se não há uma rotina clara para a inspeção de qualidade em uma linha de produção, é possível que o operador deixe de realizar a verificação completa para acelerar o trabalho. Essa decisão, embora pareça inofensiva no momento, pode resultar em produtos defeituosos, retrabalho e insatisfação do cliente. Muitas vezes, as decisões rápidas e baseadas na intuição nos levam a escolher o caminho mais fácil, ignorando as consequências.
Portanto, a clareza nos processos e a consistência nos controles são essenciais para evitar erros que afetam diretamente a produtividade e a entrega de valor ao cliente.
A linha tênue entre pressão e proteção
A segurança no trabalho é um tema que deveria ser inegociável, mas ainda assim vemos colaboradores ignorando práticas seguras para ganhar tempo ou aliviar a pressão. A ausência de processos e controles robustos, somada a uma cultura permissiva, pode criar um ambiente onde o risco é subestimado.
Imagine um cenário em que o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) é tratado como opcional. Essa lacuna na definição de processos coloca em risco não apenas o indivíduo, mas toda a equipe. Processos bem estruturados são fundamentais para prevenir falhas e criar um ambiente seguro e eficiente.
Para reduzir esses riscos, as organizações precisam reforçar continuamente a importância dos protocolos de segurança, além de investir em treinamento e fiscalização. Afinal, a vida e o bem-estar das pessoas devem estar acima de qualquer meta ou prazo.
O preço da ausência de controles
O compliance, por sua vez, é o alicerce da integridade organizacional. Quando há falhas nos controles ou as normas não são claramente comunicadas, surgem brechas que permitem comportamentos inadequados. Muitos justificam desvios de conduta com frases como “ninguém vai perceber” ou “sempre fizemos assim”.
Por exemplo, manipular dados para atingir metas pode parecer uma solução temporária, mas compromete toda a estrutura da empresa a longo prazo. A ausência de uma cultura sólida de compliance abre espaço para práticas antiéticas, que, além de prejudicarem a empresa, podem levar a sanções legais.
Em muitos casos, as pessoas sabem que o que estão fazendo é errado, mas a pressão por resultados ou a falta de ética na cultura organizacional podem influenciar suas decisões. O comportamento ético deve ser um valor que permeia todas as ações da empresa, desde os níveis mais operacionais até a alta gestão.
Um guia pessoal para decisões corretas
Uma prática simples, mas poderosa, para ajudar os colaboradores a refletirem sobre suas ações é o Teste do Espelho. Antes de tomar uma decisão, sugiro que cada um se pergunte:
- SE ESSA AÇÃO FOSSE CONHECIDA POR TODOS, EU ME SENTIRIA ORGULHOSO(A) DELA?
- ESTOU AGINDO DE ACORDO COM OS VALORES E AS POLÍTICAS DA EMPRESA?
- A MINHA DECISÃO IMPACTA POSITIVA OU NEGATIVAMENTE AS PESSOAS AO MEU REDOR?
Responder honestamente a essas perguntas promove uma autorreflexão que pode prevenir muitos erros. Essa prática é especialmente útil em situações onde os processos não são claros ou as pressões externas são intensas.
O papel dos processos e da consciência coletiva
Se há algo que aprendi ao longo dos anos, é que processos claros e controles eficientes são a base para evitar desvios no ambiente de trabalho. Contudo, eles não são suficientes por si só. A responsabilidade individual e a construção de uma cultura ética são igualmente importantes.
O Teste do Espelho oferece uma ferramenta prática para alinhar decisões com os valores organizacionais, mas é o fortalecimento dos processos e a promoção de uma cultura de integridade que realmente transformam o comportamento coletivo. Somente assim podemos criar ambientes onde as pessoas escolham o caminho certo, mesmo diante das maiores pressões.
*Augusto Zarpon é engenheiro, especialista em Lean, Six Sigma e gestão de operações, com vasta experiência em grandes multinacionais e como empreendedor na indústria de alimentos. Como instrutor técnico no SENAI, ele compartilha seu conhecimento para aumentar a empregabilidade dos profissionais e ajudar as empresas a alcançarem a excelência operacional e estratégica.