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Cadeia da carne deve adotar transparência pública como reflexo de política ambiental

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A pecuária sustentável é essencial para frear o desmatamento na Amazônia. Mas, o quão eficazes são as iniciativas de frigoríficos e varejistas nesse sentido e o quanto a sociedade as conhece?

Quando as empresas são transparentes sobre sua política ambiental, estão informando aos consumidores, investidores e financiadores quais iniciativas adotam para garantir que suas atividades não impactem negativamente o meio ambiente. Adotar essa postura é primordial para frigoríficos e varejistas, os elos-chave das fazendas pecuárias com os consumidores de carne bovina.

As informações sobre a política ambiental institucional podem ser disponibilizadas no próprio site oficial da empresa, detalhando o que o estabelecimento faz para o monitoramento e controle da cadeia de fornecedores (diretos e indiretos), se tem auditoria independente sobre as suas operações de compra de gado e a manutenção de iniciativas e boas práticas contra o desmatamento. Para se avaliar a disponibilidade desses dados e quão eficaz é a política ambiental, é preciso um indicador que traduza em número e classifique a eficácia dessa política contra o desmatamento que a empresa afirma publicamente ter.

Para observar o impacto de mitigar o desmatamento através da política ambiental apresentada por frigoríficos e varejistas que atuam ou compram na Amazônia Legal, vale perceber que a dinâmica de compra de gado na região tem grande relevância sobre a preservação das florestas. Isso porque, a medida que cresce o rebanho, para atender à demanda por abate dos frigoríficos e do consumidor do varejo, pode crescer, portanto, o desmatamento para abrir novas áreas de pastagens.

Figura 1 – Efetivo do rebanho bovino e abates totais na Amazônia Legal de 2009 a 2021

Efetivo do rebanho bovino e abates totais na Amazônia Legal de 2009 a 2021.png

Fonte: IBGE, 2023

Figura 2 – O avanço do rebanho bovino, desmatamento e áreas de pastagem na Amazônia Legal nos últimos anos

Efetivo bovino na Amazônia Legal.png

Desmatamento na Amazônia Legal.PNG

Áreas de pastagem na Amazônia Legal.png

Fonte: a) PPM, IBGE, 2022; b) Prodes, 2022; c) Lapig, 2022.

Segundo Barreto (2021), cerca de 90% da área desmatada na Amazônia é ocupada por pastagens. Um fator que contribuiu para o desmatamento na região amazônica é a prática conhecida como grilagem de terras. De acordo com Brito et al (2019), após uma revisão na legislação de regularização fundiária em 2017, houve um aumento da atuação dos grileiros, que são pessoas que ocupam ilegalmente terras públicas. O processo de grilagem começa com a invasão e desmatamento da área, geralmente abrindo grandes áreas para pastagens para justificar a ocupação e o uso do solo.

No entanto, essa prática frequentemente resulta em uma pecuária extensiva de baixa produtividade pois o último censo agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que os pastos mais produtivos da Amazônia correspondiam a apenas 20% do total de pastagens e tinham uma lotação média de 1,38 cabeça por hectare, enquanto estudos já demonstram que em pastos bem manejados se pode ter uma lotação média de 3 UA/ha (MACIEL, 2019).

Dias-Filho (2014) mostrou que houve um aumento significativo das áreas de pastagem na região Norte do Brasil entre 1975 e 2006. O estudo associa a criação de gado à prática de grilagem de terras. Isso acontece porque a atividade pecuária de corte não requer um preparo cuidadoso do terreno, nem o uso intensivo de recursos, tecnologia ou mão de obra. Dessa forma, é uma opção menos dispendiosa do que outras atividades agrícolas para ocupar e garantir a posse de grandes áreas de terra.

Em 2011, aproximadamente 70% da área de pastagem da região norte era ocupada com taxa de lotação abaixo de 0,4 UA/ha, muito aquém de bons níveis de lotação/produtividade para a pecuária discutidos na literatura e ideais na prática (Dias-filho, 2014). A demanda por carne no Brasil continua crescendo, segundo dados mais recentes do United States Department of Agriculture Foreign Agricultural Service (USDA), o Brasil foi indicado como o principal exportador de carne bovina do mundo no período de 2018 a 2022, comparado com outros países que se destacam nessa atividade (ver tabela 1).

Tabela 1 – Comércio de carne bovina, principais exportadores.

1,000 Metric Tons (equivalente ao peso da carcaça)

País 2018 2019 2020 2021 2022
Brasil 2021 2314 2539 2320 2600
Índia 1511 1494 1284 1397 1475
Austrália 1582 1739 1473 1291 1470
EUA 1433 1373 1339 1564 1497

Fonte: USDA, 2022.

Para atender a demanda por carne bovina, porém minimizando os impactos promovidos pela intensa produção, a pecuária sustentável é uma opção para que o setor cresça sem impactos negativos às florestas. A prática incentiva a utilização de áreas já desmatadas que estão abandonadas ou subutilizadas para que não se avance com o desmatamento.

Promover iniciativas de uma pecuária sustentável no setor para que se avance no monitoramento e controle sobre a cadeia de fornecedores dos frigoríficos e varejistas é essencial para frear o desmatamento na Amazônia. Para tanto, é necessário verificar se as iniciativas são perenes e eficazes ao longo do tempo. Índices de transparência precisam existir de modo que consigam analisar dados públicos das empresas e verificar quais iniciativas estas empresas reportam ao seu público e o grau de eficácia das mesmas contra o desmatamento.

Radar Verde: indicador que avalia o grau de transparência pública dos frigoríficos e varejistas

Em 2022, surgiu o Radar Verde com o objetivo de avaliar o nível de compromisso dos frigoríficos e varejistas contra o desmatamento e analisar a eficácia da política ambiental desses elos-chave na cadeia da carne. Inicialmente, o indicador analisou resultados dos questionários respondidos por estabelecimentos mapeados do setor, a fim de obter uma classificação do grau de controle que as políticas ambientais das empresas têm sobre seus fornecedores de bovinos.

Observando a necessidade de avaliar o nível de compromisso dos frigoríficos e varejistas contra o desmatamento e analisando a eficácia da política ambiental destes elos-chave na cadeia da carne surgiu o Radar Verde em 2022. A princípio, o indicador realiza a análise aplicando questionários sobre os estabelecimentos mapeados do setor de modo a obter uma classificação do grau de controle que a política ambiental das empresas possuem sobre os seus fornecedores de bovinos.

Em 2023, o Radar Verde adicionou à sua metodologia o Grau de Transparência Pública, um indicador que avalia o grau de controle das empresas sobre seus fornecedores a partir dos dados públicos disponibilizados nos websites das empresas mapeadas.

Para 2023, o Radar Verde acrescentou em sua metodologia o Grau de Transparência Pública, um indicador que avalia o grau de controle das empresas sobre os seus fornecedores, mas a partir dos dados disponibilizados nos websites das empresas mapeadas.

Todas as empresas mapeadas pelo Radar Verde são avaliadas no indicador do Grau de Transparência, de acordo com os dados públicos disponíveis em seus respectivos sites, através de um questionário, minuciosamente elaborado e preenchido pela equipe Radar Verde, para verificar, se a partir dos dados disponibilizados pela empresa é possível assegurar a existência e a implementação de políticas ambientais fortes contra o desmatamento na cadeia da carne.

Para obtermos uma visão mais ampla dos assuntos em questão, é importante observarmos a deficiência em transparência por parte do setor como um todo (frigoríficos e varejistas). Por exemplo, em uma pesquisa por amostragem realizada pelos autores, verificou-se que, em 30 empresas varejistas analisadas, apenas 16% delas possuíam em seus sites informações sobre suas políticas sustentáveis e valores ambientais relacionados à preservação da Amazônia Legal e à intenção de contribuir positivamente para reduzir ou impedir o desmatamento da floresta.

Para termos uma visão mais ampla dos assuntos relatados, podemos observar a deficiência em transparência por parte do Varejo, por exemplo, onde através de uma pesquisa por amostragem realizada pelos autores verificando o site - que se trata de um grande e eficaz meio de comunicação da empresa com os seus stakeholders - de 30 empresas varejistas, apenas 16% da amostragem possuía descrito a sua Política Sustentável, bem como, valores ambientais, que denotam a sua preocupação com a preservação da Amazônia Legal e intenção de ajudar de forma positiva junto a reduzir ou impedir o desmatamento da floresta.

Desta forma, o grau de transparência pública pode transmitir ao consumidor final ou outras partes interessadas a informação precisa a respeito da eficácia da política ambiental da empresa e o quão eficaz ela é contra o desmatamento a partir de critérios já pré-definidos pelo indicador de transparência.

Como se dá a apresentação de resultados do Grau de Transparência Pública do Radar Verde

O Grau de Transparência Pública tem como objetivo avaliar se as informações disponibilizadas pelas empresas em seus websites sobre suas políticas ambientais são eficazes em garantir que a origem dos animais comprados para produção não esteja relacionada a áreas desmatadas.

Esse índice é importante para fornecer às partes interessadas uma nota que classifica o estabelecimento de acordo com seus esforços e iniciativas para monitorar e controlar seus fornecedores diretos e indiretos, além de demonstrar quais são essas iniciativas. O índice apresenta, em uma escala de 0 a 100, o quão eficaz pode ser a política ambiental da empresa, disponível publicamente.

O Grau de Transparência Pública visa avaliar se o que a empresa disponibiliza em seu website a respeito da sua política ambiental demonstra eficácia de modo a garantir que a origem dos animais comprados para produção não está relacionada a áreas desmatadas.

Ele é importante para oferecer para todas as partes interessadas uma nota que classifica o estabelecimento de acordo com os esforços e iniciativas que o mesmo tem feito para aplicar os seus monitoramentos e controles sobre os seus fornecedores diretos e indiretos e demonstrar quais são estas iniciativas. O índice apresenta, em uma escala de 0 a 100, o quão eficaz a política ambiental da empresa, disponível de forma pública, pode ser.

Os resultados podem ser observados no site da iniciativa (https://radarverde.org.br/).

Figura 3 – Modelo de apresentação dos resultados do Radar Verde para frigoríficos

Modelo de apresentação dos resultados do Radar Verde para frigoríficos.png

Fonte: Radar Verde, 2023.

Figura 4 – Modelo de apresentação dos resultados do Radar Verde para supermercados

Modelo de apresentação dos resultados do Radar Verde para supermercados.png

Fonte: Radar Verde, 2023.

Figura 5 – Legenda de classe de cores dos resultados do Radar Verde.

Legenda de classe de cores dos resultados do Radar Verde.png

Fonte: Radar Verde, 2023.

REFERÊNCIAS

BARRETO, Paulo et al. Os frigoríficos vão ajudar a zerar o desmatamento da Amazônia. Imazon e ICV, 2017.

BARRETO, Paulo. Políticas para desenvolver a pecuária na Amazônia sem desmatamento(p.66). Amazônia 2030, 2021.

DIAS-FILHO, M. B. Diagnóstico das Pastagens no Brasil. Embrapa Amazônia Oriental, 2014. (Disponível em https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/bitstream/doc/986147/1/DOC402.pdf)

MACIEL, G. Artigo: Sim! Seu pasto é uma lavoura! Embrapa, 2019. (Disponível em https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/48055370/artigo---sim-seu-pasto-e-uma-lavoura#:~:text=Isso%20indica%20que%20a%20%C3%A1rea,m%C3%A9dia%20de%203%20UA%2Fha.)

RADAR VERDE. Metodologia de avaliação: Grau de transparência pública(frigoríficos e varejistas). Imazon e O Mundo Que Queremos, 2023. (Disponível em https://radarverde.org.br/wp-content/uploads/2023/06/00_Metodologia-RadarVerde-2023.pdf).

USDA. Livestock and Poultry: World Markets and Trade, Abril de 2022. (Disponível em apps.fas.usda.gov/psdonline/circulars/livestock_poultry.pdf).

 

AUTORES

Arthur José da Silva Rocha
Formado em Engenharia Cartográfica e de Agrimensura pela Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA). Atualmente é Trainee de pesquisa no Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), onde se dedica a atividades relacionadas ao geoprocessamento e sensoriamento remoto.

Camila Trigueiro de Lima

Formada em Engenharia de Alimentos pela Universidade Federal do Maranhão. Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho pela Arthur Thomas, possui aperfeiçoamento em Gestão pela Ohio University e Greenbelt Lean Six Sigma. Trabalhou na gestão de controle de qualidade em indústrias multinacionais de bebidas e alimentos(frigoríficos). Foi professora de nível superior nos cursos de engenharia, premiada na modalidade STEM no grupo Wyden para realização de projeto sobre smart cities em Berlim, Alemanha. Atualmente é Analista de Pesquisa do Radar Verde e do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

Débora Bianca Câmara Moreira Mora

Consultora, Gestora Ambiental, Bacharel em Direito, especialista em Sistema de Gestão Ambiental ISO 14001. Tem experiência na área de Meio Ambiente, Rastreabilidade e Sustentabilidade de Frigoríficos.

 

LEIA MAIS

  1. Brasil deve reduzir o desmatamento para aumentar a produção agropecuária
  2. Está nas mãos da pecuária ajudar a zerar o desmatamento na Amazônia
  3. Rastreabilidade de bovinos: qual o custo de cada boi abatido no Brasil?
  4. Produção de carne e o mercado de carbono
  5. A Economia Circular na Amazônia
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