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O 5S pós-coronavírus

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Um exercício de projeção do futuro próximo com a associação da filosofia do 5S e da tecnologia para acelerar o retorno das empresas em um novo normal.

Obsessão pela limpeza, higiene asseada, somente o indispensável sobre as mesas e bancadas, disciplina na utilização, substituição e reposição de equipamentos de proteção individual e coletivos, preocupação com o meio ambiente e com as pessoas, monitoramento efetivo da saúde, segurança e comportamento das pessoas... Toda a ciência que cerca o novo normal pós epidemia está diretamente associada a uma filosofia que data da década de 1950 e foi desenvolvido pelo Prof. Kaoro Ishikawa e sua equipe, que faz parte do jargão da indústria em todos os continentes, chamado 5S.

O livro do Sr. Kenji Nakata[1], que foi membro da equipe do prof. Ishikawa referida acima, nos fornece a abordagem original e sua evolução, sempre focada em produtividade organizacional. A partir dos seus conceitos e das diversas publicações atuais em periódicos e na web que projetam como deve ser o novo normal, pode-se realizar um exercício de hipóteses válidas em qualquer situação futura. Essa visão, que trata senso a senso do 5S, mostra como a tal filosofia pode acelerar a retomada das atividades econômicas nas empresas de forma enxuta, bem como minimizar os riscos tanto atuais quanto vindouros e preconizar a mudança cultural que forçosamente precisamos realizar.

  1. Seiri – senso de arrumação: consiste em separar o necessário para a atividade e descartar o desnecessário. Esse senso leva as pessoas a manterem em seus postos de trabalho, administrativos ou produtivos, somente o realmente necessário para a execução de sua atividade. Mais do que nunca, excesso significa risco de infecção e exposição às intempéries do dia-a-dia. Nessa filosofia, por um lado os colaboradores terão que ceder ao ímpeto de ter os bonecos de super-heróis em suas mesas e a empresa deverá permitir que os mesmos bonecos apareçam na área de trabalho do notebook ou computador, afinal são esses heróis ou a foto da família que fazem com que o funcionário inspire-se em sua contribuição para a organização. Assim como Shecklton[2], nosso Endurance não é mais porto seguro, prosseguir nossa viagem é essencial e devemos caminhar o mais enxutos possível para sobrevivermos e superarmos esse momento e os vindouros. Contudo, com o aporte tecnológico não seremos obrigados assim com os 28 expedicionários da Antártica a matarmos nossos cães nem abrir mão de conforto e contato com o mundo.

Outra reflexão importante será com relação aos utensílios e equipamentos de uso coletivo como impressoras, grampeadores, bebedouros, ferramentas etc. Esses devem ser disponibilizados e manuseados com responsabilidade, com o intuito de maximizamos o valor gerado e reduzimos os custos operacionais na utilização dos bens a partir da conscientização dos colaboradores e da necessidade de assepsia antes e após a utilização individual pelo próprio usuário. As organizações terão também que disponibilizar meios “inteligentes” para limpeza eficaz desses itens. Talvez as caixas ou quadros de ferramentas possam sofrer borrifadas de spray automáticas assim que fechadas ao mesmo tempo que produtos coloridos possam ser disponibilizados para limpeza de partes da impressora – se alguém tocou e não limpou fica vermelho, por hipótese.

  1. Seiton – senso de ordenação: significa organizar e sinalizar para que todos identifiquem rapidamente onde está o objeto ou informação necessária. Nesse sentido devemos ser muito responsáveis e disciplinados na organização do ambiente de trabalho, seja na empresa ou no home-office. Todas ações devem ser rastreáveis para segurança e tudo muito bem identificado para que a empresa e os colaboradores possam entregar o seu valor ao cliente e à sociedade.

Aqui entram a LGPD (Lei Geral da Proteção de Dados) garantindo o sigilo dos dados pessoais, as políticas para proteção de dados organizacionais e o data analytics assegurando não só acesso, mas também uma análise correta dos comportamentos e processos. A segurança da informação e o compliance (garantia de cumprimento das normas legais e reguladoras) são e serão fundamentais num ambiente híbrido empresa / home office, em que os serviços prestados serão gerenciados a distância.

No mesmo sentido, é possível imaginar que os acessos ao ambiente fabril seja cada vez mais monitorado, a partir da identificação facial ou acompanhamento por câmeras checando não só o distanciamento das pessoas como também as suas atividades em conformidade com os procedimentos estabelecidos.

Seria até desnecessário citar a necessidade cada vez mais de procedimentos e instruções de trabalho muito bem documentados, atualizados e de acesso instantâneo conforme a sua necessidade, até por palavras ou gestos. Somada a isso, a IA (Inteligência Artificial) deverá num futuro próximo checar o cumprimento dos procedimentos organizacionais tanto na execução de atividades na empresa quanto em home office, não no sentido de controlar as pessoas, que devem obviamente gozarem de maior liberdade, mas com o intuito de garantir que os padrões organizacionais sejam realizados corretamente.

  1. Seisso – senso de limpeza: nada de lixo ou sujeira no ambiente de trabalho com inspeção para detectar e eliminar pequenos defeitos. O principal objetivo da limpeza é justamente permitir a redução de riscos operacionais. Sujeiras ou resíduos, além de sinais de risco para a operação, podem ocultar reais problemas como vazamento de óleo das máquinas ou sinais de desgaste dos equipamentos. Da mesma forma, barulho excessivo no ambiente fabril pode tornar imperceptível o ruído de mal funcionamento de uma máquina ou, no escritório, a poluição da estação de trabalho pode tirar a atenção quanto às prioridades requeridas.

Ainda no seisso estão os princípios da Economia Circular, que cuida do retorno, reaproveitamento e/ou correto destino dos resíduos gerados na empresa, quer sejam no ambiente de produção ou nos rejeitos como embalagens ou subprodutos após sua utilização pelo cliente. Essa já era uma preocupação, tendência e prática nas grandes empresas, mas deverá ser intensificada em todos as organizações, impulsionadas ou não por fiscalização e regulação governamental. Resíduos corretamente destinados reduzem drasticamente a contaminação do ambiente e, consequentemente, a proliferação de riscos à saúde das pessoas e do planeta.

As pessoas em seu cotidiano também devem ter disciplina e efetivamente destinarem corretamente os seus lixos domésticos. Fica evidente que, seja em casa ou no ambiente empresarial, todos os resíduos devem ser descartados corretamente para coleta seletiva e destino adequado. Hoje há em geral um retrabalho, pois muitas pessoas descartam os resíduos orgânicos junto com os recicláveis, o que obriga a separação do descarte daquilo que pode ser reaproveitado. Também há a necessidade da consolidação da cultura para a Sustentabilidade com a massificação da informação do que é ou não reciclável, como destinar corretamente os resíduos, além da simplificação dos seus pontos de coleta.

  1. Seiketsu – senso de higiene: mais do que cuidar das condições sanitárias, o seiketsu cuida da retidão do caráter e da conduta das pessoas. Aqui vale a máxima da segurança do trabalho que preconiza: “eu me cuido, eu cuido do outro e deixo o outro cuidar de mim”, se todos estivermos atentos, os riscos de acidentes e contaminação serão reduzidos. Com o aumento do distanciamento, talvez não estejamos próximos aos outros colaboradores para identificar oportunidades, mas é fundamental termos os cuidados e talvez a tecnologia possa também contribuir assegurando as regras e identificando os comportamentos de risco.

Na manutenção de equipamentos, para citar um exemplo, a assistência remota online a partir de óculos ou câmeras e som é muito bem-vinda, garantindo tanto a segurança quanto a execução das tarefas, podendo inclusive garantir o corte de energia dos equipamentos manutenidos de forma automática e o acionamento de alarme no caso de alguma ocorrência.

Já no home office o seiketsu deve ser observado sobretudo na responsabilidade de conduta, observando as normas e práticas da organização e agindo com autonomia, ética e comprometimento com dados e informações da empresa.

  1. Shitsuke – senso de disciplina: cria o hábito de seguir as regras da sociedade e da organização, que na prática significa colocar-se no lugar do outro. Esse senso é o que sintetiza todos os demais e o que perpetua o 5S, assegurando a criação e o cumprimento de normas básicas de convivência e ética.

Nas disposições gerais, espera-se que os colaboradores cumpram as regras escritas e tácitas de forma natural, desde a execução das tarefas até o cuidado posterior de limpar as ferramentas adequadamente e deixa-las no local correto após a realização de um serviço. Aqui vale os sensos de ordenação (seiton) e limpeza (seisso), que exigirá não só exercícios de delegação por parte dos líderes e organizações, como o comprometimento do colaborador. Isso só é possível com confiança entre as partes envolvidas no negócio (colaboradores, líderes e empresas).

Também na comunicação via web estão surgindo protocolos e condutas adequadas, não podemos esquecer que a interação por tecnologia é diferente da conversa presencial e que mal-entendidos devem que ser evitados e prontamente resolvidos para não gerarem um problema maior. Nesse caso, a comunicação deve ser sempre clara e transparente (seiri), seguindo talvez protocolos que se criem para evitar interpretações indesejadas. Sobretudo nesse quesito, os gestores deverão ter papel fundamental para motivarem, direcionarem e manterem suas equipes informadas, alinhadas e focadas nos objetivos organizacionais.

A tomada de decisão também deverá ser cada vez mais auxiliada pela tecnologia, visto que essas serão a somatória de pareceres de diversas pessoas dispostas em locais diferentes, sendo o consenso consolidado por uma videoconferência. Nesse sentido, a missão, visão e valores, bem como a estratégia organizacional devem estar explícitas e claras, de forma que as pessoas saibam exatamente o que se espera de cada uma delas e, assim, agirem. Vale ressaltar aqui o papel fundamental das lideranças como orientadores e guardiões das diretrizes organizacionais em um ambiente em que a hierarquia tende a ser enxuta e prática.

Na empresa enxuta, o seiketsu contribui ainda com a estratégia corporativa ao orientar tanto os investimentos (CAPEX – Capital Expenditure) como os gastos operacionais (OPEX – Operational Expenditure), de forma a assegurarem o mínimo de desperdício na organização e, consequentemente, sua competitividade no mercado de atuação e sustentabilidade perante seus colaboradores, sociedade e investidores. Toda e qualquer alocação de caixa ou patrimônio da empresa deverá obrigatoriamente atender aos 5 sensos de forma a garantir o alinhamento estratégico, a geração de valor para o cliente com o mínimo de desperdício, e o consequente e necessário lucro para manutenção do negócio.

Num exercício de kaizen (mudança para melhor), observa-se a importância da filosofia do 5S na vida das organizações e podemos usá-lo para antecipar uma retomada de atividades de uma forma saudável, segura e rápida, já prevendo inclusive novas possíveis ameaças, sejam por fatores naturais ou não. Arriscando prever um futuro que consolida o que já se simula nas últimas décadas sobretudo na indústria, parece que estamos próximos de um mundo mais enxuto, onde as relações humanas serão priorizadas, numa cultura de comprometimento, confiança e sobretudo, amor ao próximo. Esse é o verdadeiro espírito do 5S.

 

[1] NAKATA, Kenji. Acerto 100% desperdício zero – um novo conceito dos 5S. Editora Infinito, 2000.

[2] LANSING, Alfred. A Incrível Viagem de Shackleton - A Saga do Endurance. Sextante, 2011.

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